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terça-feira, 14 de junho de 2011

Crônicas - O Travesseiro Maldito

Dando continuidade a série "Crônicas", é a vez de André Rossi mostrar uma crônica produzida para as aulas da Vadinea. Confira abaixo a história de "O Travesseiro Maldito".

Era quase meia noite e David ainda insistia naquela fase. Será que aquela estrutura não cairia nunca? Estava com seu Angry Bird favorito, que costumava chamar de “bird-bomb”. O efeito explosivo daquela ave lhe agradava – e muito! Quando estava finalmente chegando perto de destruir a estrutura e aniquilar o último malvado porco verde, seu querido celular o deixou na mão e sua bateria foi totalmente descarregada. “Maldição. Devia ter investido em um iPhone”, pensou ele, colocando com raiva o carregador no aparelho. Tendo que acordar às 5h da matina no dia seguinte, concluiu que deveria ir para a cama.

Contudo, ao sair da pequena sala de seu apartamento alugado em direção ao quarto, reparou no grande pacote em cima da pequena mesa de refeições que havia chegado à tarde pelo Correio e que ele não havia tido tempo para abrir. O remetente, para desespero de David, era sua mãe. Será que se tratava de mais algum conjunto de banho daquela amiga dela que só vendia produtos indicados para velhos e senhoras de meia idade? Poxa vida, ele já era um Mochileiro experiente e tinha sua toalha preferida, não precisava de mais nada do gênero. Porém, a embalagem era leve demais. Intrigado, David sacou o canivete que guardava na gaveta do armário da cozinha e abriu o pacote de papelão rapidamente.

“Travesseiro? Valeu, Mãe. Só tenho 4 aqui em casa mesmo, precisava de mais um...” bufou o rapaz, agora proprietário de 5 travesseiros.

Entrou no quarto, jogou o novo travesseiro na cama para que se familiarizasse com seus semelhantes, encobrindo a face encapuzada do Batman que ilustrava a colcha da cama. Após vestir seu pijama listrado em azul a branco, foi para baixo das cobertas, ajeitando-se com seus travesseiros. O novato da turma, para sua surpresa, era extremamente macio e confortável. “Por que não?”, pensou David, substituindo o travesseiro no qual apoiava sua cabeça e havia apelidado de Babão pelo Buzz Lightyear da parada.

Sem muito esforço, David caiu no sono. Durante seus sonhos, alguém que ele não conseguia identificar tentava sufoca-lo com um travesseiro. Desesperado, tentava agitar seu corpo, empurrar a pessoa para longe... mas não conseguia, seu corpo não obedecia. Foi então que, inesperadamente, David abriu seus olhos e sentiu uma presença macia e terrivelmente pesada sobre seu globo ocular: o travesseiro está me sufocando?

Em um impulso violento, David jogou o travesseiro longe e ficou parado em pé ao lado da cama, fitando o criminoso objeto jogado no chão. Respirava com dificuldade e não conseguia assimilar o que estava acontecendo de fato. E agora, o que fazer?

Com cuidado, pulou o travesseiro que se encontrava caído perto da porta e foi até a sala. Ligou o monitor do computador que deixará ligado e postou no twitter: “Gente, meu travesseiro tentou me sufocar!!! E agora, o que faço? #meajuda #morrediabo”. Como consequência de seu pedido de socorro, dezenas de RT’s ironizando o acontecido apareceram na Timeline de David. Tentou por duas vezes explicar o que estava acontecendo, mas ninguém acreditava nele.  Desesperado, tentou ligar para sua mãe. Ela não atendia. “Aff, me manda o travesseiro do Demônio e não atende ao telefone para ouvir o filho morrer!” bradava o rapaz amedrontado.

Com cautela, foi até a cozinha e ficou parado há mais ou menos 5 metros da porta de seu quarto, onde o travesseiro assassino estava localizado; a perigosa forma retangular revestida de algodão parecia fitar-lhe provocantemente, como se dissesse: “Vem tirar um sonequinha aqui... descansa a cabeçinha em mim... vai ser gostoso”. David estapeou a própria face para afastar o pensamento. “O travesseiro está me seduzindo?”

De fato, o rapaz estava com uma vontade imensa de descansar a cabeça sobre o confortável travesseiro, afinal teve um dia tão longo... merecia descansar. Começou a caminhar em direção à porta. Quando estava há centímetros do travesseiro, uma imagem veio a sua mente. O pôster do filme “Piratas do Caribe – Navegando em Águas Misteriosas” que era ilustrado por Sereias. “MEU DEUS! O TRAVESSEIRO É UMA SEREIA!!!” bradou o rapaz, que se afastou bruscamente do travesseiro. Foi até a cozinha, pegou uma grande sacola de compras da Comic Com de 2010 e aprisionou a Sereia quadrada.

Desceu as escadas do prédio, saiu correndo pela portaria sem ao menos olhar para o porteiro (que assistia tranquilamente o Jornal da Globo enquanto tomava um cafezinho) e começou a percorrer tal qual o Flash  toda a extensão da rua Barão de Iguape. Subiu a direita na rua Galvão Bueno, andou uma quadra e chegou à Delegacia Geral da Polícia Civil.

Conversou com o delegado, explicou a situação e mostrou a sacola na qual aprisionara a ameaça. Matias, o delegado, fitou com um olhar cômico a sacola e a abriu, ignorando as recomendações histéricas de David para que não fizesse aquilo.

Após abafar um riso, fechou a sacola, se esforçou para fazer a expressão mais séria possível e disse: “Fique tranquilo, David. Vamos enquadrar esse travesseiro meliante e garanto para você que ele verá o sol nascer quadrado para o resto de sua vida”.

David tentou explicar ao delegado que talvez fosse melhor chamar um exorcista para expulsar o demônio do travesseiro, mas Matias amenizou a situação dizendo que tudo ficaria bem e que ele mesmo se encarregaria de resolver o problema. Relutante, David deixou a delegacia. Ao final de seu expediente, por volta das 5h da manhã, o delegado Matias deixou a delegacia levando consigo o travesseiro novo que tinha ganhado graças à mente perturbada de um nerd abobado.

Durante todo dia, David ficou pensando em como o delegado daria um fim no travesseiro. À noite, dormiu muitíssimo bem e quase esqueceu do assunto. Na manhã do dia seguinte, tomou seu café da manhã agradavelmente, arrumou sua mochila e saiu para o trabalho. Como David trabalhava com programação de computadores, sempre passava pela banca de jornal que ficava próxima ao ponto de ônibus para comprar alguma revista sobre o assunto. Apesar de saber que não haveria nenhum lançamento esse dia, parou na banca para comprar chicletes. Já estava deixando a banca quando se deparou com a manchete do jornal Folha de S. Paulo: “Delegado e esposa são encontrados asfixiados em sua casa”, seguido da linha fina: “Suspeita-se que o assassinato tenha sido cometido com os travesseiros do casal”, seguido da foto do delegado Matias com a esposa Jaqueline em uma mesa de bar.

A única reação de David foi pronunciar em voz baixa: “Puta que p....”.


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